Decisão proferida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no dia 26 de outubro de 2023 reconheceu a validade da Lei 9.514/97 face aos princípios constitucionais. Referida lei autoriza instituições financeiras que operam dentro do Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI) a levar imóveis a leilão sem passar por processo judicial.

Várias matérias foram veiculadas na mídia dizendo que o STF autorizou as instituições financeiras a mandar imóveis financiados a leilão sem precisar de processo judicial. Importante destacar aqui que não foi esta a decisão tomada pelo Supremo, e muito menos se trata de uma prática nova.

Primeiramente, antes da entrada em vigor da Lei 9.514/97 as instituições financeiras que ofertavam financiamento habitacional já podiam fazer uso da execução extrajudicial e leilão de imóveis sem precisar ir ao poder judiciário graças ao Decreto-Lei 70/66.

Referido diploma legal dispunha sobre procedimento de execução de contratos de financiamento habitacional vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação (SFH) que eram garantidos por hipoteca. Mesmo tendo parte de seu texto revogado pela Lei 14.711/2023, vale trazer o procedimento que lá estava disposto:

Art. 31. Vencida e não paga a dívida hipotecária, no todo ou em parte, o credor que houver preferido executá-la de acordo com este decreto-lei formalizará ao agente fiduciário a solicitação de execução da dívida, instruindo-a com os seguintes documentos:

(…)

§ 1º Recebida a solicitação da execução da dívida, o agente fiduciário, nos dez dias subseqüentes, promoverá a notificação do devedor, por intermédio de Cartório de Títulos e Documentos, concedendo-lhe o prazo de vinte dias para a purgação da mora.

Art 32. Não acudindo o devedor à purgação do débito, o agente fiduciário estará de pleno direito autorizado a publicar editais e a efetuar no decurso dos 15 (quinze) dias imediatos, o primeiro público leilão do imóvel hipotecado.

Já no ano de 2021, o STF enfrentou o tema da constitucionalidade do Decreto-Lei 70/66 firmando a seguinte tese:

Tema 249: É constitucional, pois foi devidamente recepcionado pela Constituição Federal de 1988, o procedimento de execução extrajudicial, previsto no Decreto-lei nº 70/66.

Como se vê, o posicionamento adotado para reconhecimento da validade da Lei 9.514/97 foi praticamente o mesmo adotado para constitucionalidade do Decreto-Lei 70/66, não tratando-se de inovação.

Sobre a Lei 9.514/97, ela foi editada com a finalidade de instituir o Sistema de Financiamento Imobiliário, instituir a alienação fiduciária de coisa imóvel e dar outras providências. Assim como a hipoteca, a alienação fiduciária também é uma garantia real conferida a bem imóvel, ou seja, houve a substituição da garantia real e consequentemente o aprimoramento do procedimento de execução dos contratos em caso de inadimplência do mutuário.

Pela nova lei, dispensou-se a “contratação” de um agente fiduciário e o procedimento passou a ser realizado pelo banco credor, conforme se infere das disposições legais abaixo citadas:

Art. 26. Vencida e não paga a dívida, no todo ou em parte, e constituídos em mora o devedor e, se for o caso, o terceiro fiduciante, será consolidada, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário.

§ 1º Para fins do disposto neste artigo, o devedor e, se for o caso, o terceiro fiduciante serão intimados, a requerimento do fiduciário, pelo oficial do registro de imóveis competente, a satisfazer, no prazo de 15 (quinze) dias, a prestação vencida e aquelas que vencerem até a data do pagamento, os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais, os encargos legais, inclusive os tributos, as contribuições condominiais imputáveis ao imóvel e as despesas de cobrança e de intimação.

(…)

§ 7o Decorrido o prazo de que trata o § 1o sem a purgação da mora, o oficial do competente Registro de Imóveis, certificando esse fato, promoverá a averbação, na matrícula do imóvel, da consolidação da propriedade em nome do fiduciário, à vista da prova do pagamento por este, do imposto de transmissão inter vivos e, se for o caso, do laudêmio.

Art. 27. Consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário promoverá leilão público para a alienação do imóvel, no prazo de 60 (sessenta) dias, contado da data do registro de que trata o § 7º do art. 26 desta Lei.     (Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)

Os mutuários devem ficar bastante atentos à inadimplência de seu contrato, pois, ao contrário do alegado em diversas matérias, o procedimento de execução extrajudicial do contrato não é uma novidade decorrente de decisão do Supremo Tribunal Federal. Esse procedimento já vem sendo realizado desde 1966 com base no Decreto-Lei 70/66 e se manteve com a entrada em vigor da Lei 9.514 de 1997.