As inovações tecnológicas possibilitaram a compra da casa própria com apenas um clique. No entanto, é preciso cuidado para evitar problemas que só serão resolvidos na justiça
Os aplicativos de mensagens instantâneas e as redes sociais invadiram de vez a vida das pessoas, mudando sua forma de relacionar com o mundo. Para além do simples divertimento, estes recursos estão sendo cada vez mais usados para fechar importantes transações comerciais, que envolvem até mesmo o mercado imobiliário. No entanto, a recomendação da Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação (ABMH) é que se tenha muita cautela antes de fechar o negócio.
Esse cuidado é essencial para evitar problemas como o vivenciado por Aline M. F., de Uberaba, no Triângulo Mineiro. Em decisão tomada no dia 7 de julho, o juiz da 1ª Vara Cível da Comarca da cidade condenou Gustavo L. A. a devolver mais de R$ 65 mil a Aline, que havia comprado dele um terreno. Toda a transação foi realizada por meio do WhatsApp — aplicativo de aparelho celular —, incluindo o envio do recibo de depósito do dinheiro (R$ 50 mil) e cópias de documentos. No entanto, como a escritura não foi lavrada, a compradora acionou a Justiça.
De acordo com o juiz Lúcio Eduardo de Brito, que proferiu a sentença, “a validade do negócio é plena, pois há proposta e há aceitação, que dentro da moderna concepção jurídica dos contratos é plenamente aceita. Aliás, o Código Civil cuida do tema quando considera juridicamente presente em uma proposta a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante.”
Além do aplicativo, redes sociais também são muitos utilizados. Em 2009, uma construtora concluiu a venda do primeiro apartamento utilizando o Twitter. Localizado no Alto da Lapa, bairro nobre de São Paulo, o imóvel foi comercializado na época por R$ 500 mil. O comprador, um gerente de TI que preferiu não se identificar, seguia a empresa no Twitter e se interessou por uma promoção voltada para usuários de redes sociais.
No entanto, para evitar problemas como o vivenciado pela moradora de Uberaba, o presidente da ABMH, Lúcio Delfino, orienta o consumidor a sempre exigir um contrato escrito, no qual constem todos os detalhes da operação. “Em primeiro lugar, temos que lembrar que a compra e venda de bens imóveis no Brasil só se concretiza no momento em que o título de transferência de propriedade é registrado no cartório de registro de imóveis”, destaca.
Esse título pode ser a escritura pública de compra e venda, de inventário, de doação, de divórcio e partilha de bens, a carta de arrematação ou o contrato particular de compra e venda com financiamento imobiliário ou utilização de FGTS (isto é, contratos ligados ao Sistema Financeiro da Habitação – SFH), como exemplifica Delfino. “Não interessa qual o título, o importante é registrá-lo”, ressalta.
Até que seja assinado o título de transferência de propriedade, entretanto, é comum que seja feito um contrato de promessa (ou compromisso) de compra e venda. “Ao contrário do contrato definitivo de compra e venda, a lei não exige que esse contrato inicial (de promessa ou compromisso) seja escrito. Nada impede que ele seja verbal ou tratado por vias ‘não convencionais’.”
Também conhecidos como contratos de gaveta, os contratos particulares de promessa de compra e venda não são títulos capazes de transferir a propriedade. “Ou seja, tratam-se de contratos de intenção de uma futura compra e venda. Embora tenham validade entre as partes que o assinam, não são capazes de transferir a propriedade do bem para o comprador. A transferência precisa ser feita por algum dos títulos especificados na Lei de Registros Públicos (Lei Federal nº 6.015/73)”, completa.
Apesar de não serem capazes de transferir a propriedade, Lúcio Delfino diz que a grande maioria das negociações de compra e venda de bens imóveis se inicia com um contrato particular, feito entre vendedor e comprador, muitas vezes intermediado por um corretor de imóveis ou imobiliária. “É o primeiro passo da negociação, em que se estabelecem as condições para a futura conclusão da compra e venda, tais como preço, que pode ser reajustado ou não, forma e prazo de pagamento e de entrega das chaves, prazo para assinatura da escritura ou contrato de compra e venda definitivo, condições do imóvel, responsabilidade pelos tributos e taxas incidentes sobre a unidade, multas por descumprimento total ou parcial do contrato, entre outros”, conta Delfino.
Após a quitação do preço estipulado no contrato particular, cabe ao vendedor assinar o título de compra e venda definitivo, e ao comprador registrá-lo no cartório de Registro de Imóveis. “Cabe lembrar que a quitação pode ser feita com recursos próprios, FGTS, financiamento ou consórcio imobiliário, nestas últimas modalidades, é comum que o próprio contrato de utilização de FGTS, financiamento ou consórcio, seja utilizado, também, como título de compra e venda, especialmente quando a operação é feita por agentes que operem com o Sistema Financeiro da Habitação. De toda forma, cabe reiterar: ‘Quem não registra não é dono!'”, frisa o presidente da ABMH.