Sobe número de mutuários pensando em devolver imóvel para construtora

Consultas sobre rescisão de contrato no 1º semestre de 2015 supera o acumulado de 2014

Joyce Carla, do R7

O aumento dos juros, a redução do valor dos imóveis e a preocupação com o emprego estão afetando o mercado imobiliário e fazendo subir o número de mutuários que estão pensando em devolver o imóvel na planta para as construtoras.

De acordo com a ABMH (Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação), o número de atendimentos a mutuários com dúvidas sobre rescisão de contratos subiu de 237 em 2013, para 1.082 em 2014 e, neste ano, apenas no primeiro semestre, já foram 1.839.

O presidente da associação, Lúcio de Queiroz Delfino, afirma que o número de consultas ligadas à rescisão contratual (ou distrato), aumentou muito esse ano, mas nem todos os atendimentos resultaram em distratos.

— Muitas vezes, o interessado procura a ABMH para tirar dúvidas a respeito do assunto, saber se compensa ou não optar pela rescisão, quais são as vantagens e desvantagens, e depois toma sua decisão.

O professor universitário Wilson Donizeti Fernandes, de 49 anos, é um dos mutuários que devolveram o imóvel para a construtora, porque os juros do financiamento subiram, o que deixou o valor da parcela maior do que o esperado. Ele estava comprando um imóvel para investimento, utilizaria o valor do aluguel para complementar a renda no futuro, principalmente, na aposentadoria.

— Comprei o imóvel no fim de 2012. Ele foi entregue em junho deste ano. Um pouco antes, decidi devolver, porque teria que comprometer muito da minha renda com o pagamento das prestações do financiamento.

Fernandes conta que precisou entrar com uma ação na Justiça contra a construtora, porque o valor do distrato, de acordo com o contrato assinado na compra, seria de apenas 70% do que foi pago para a empresa, e não considerava o valor pago para os corretores.

— Entrei com o processo e, já na primeira instância, a Justiça me deu ganho para que houvesse a devolução de 80% do valor pago para a construtora. Como a decisão do juiz não obrigou a devolução do valor da corretagem, eu recorri. E, segundo os advogados, a tendência é de ganhar na segunda instância também.

O advogado especialista em direito imobiliário e presidente do Comitê de Habitação da OAB/SP, Marcelo de Andrade Tapai, também sentiu esse aumento de procura de clientes para fazer distratos.

— Em 2013, o escritório registrou 73 ações de distrato. No ano passado, já foram 269 sobre o assunto. E, neste ano (de janeiro até 20 de outubro), já fizemos 410 ações de rescisão.

Tapai afirma que “ninguém compra um imóvel pensando em ter que perdê-lo, muito menos se programa para uma eventual perda do emprego, mas são situações que acontecem”.

— Com as demissões dos últimos meses, muitos compradores que estavam pagando as parcelas das obras estão tendo dificuldades para continuar cumprindo com seus compromissos.

Cenário

Em agosto, a Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias) já havia notado o aumento no volume de cancelamentos de compra de imóveis. Segundo a associação, esse processo se deve, principalmente, à volatilidade macroeconômica do País e o cenário permanece estável na visão das incorporadoras.

Segundo o diretor de comunicação da Abrainc, Luiz Fernando Moura, em 2010, 2011 e 2012, quando os compradores fecharam contratos  o país estava em uma situação diferente, com juros menores e crédito mais abundante. Agora, no momento da entrega das chaves, quando o consumidor vai assumir um financiamento com os bancos, há a divisão entre os investidores de curto prazo e de longo prazo.

— Houve a chegada de muitos investidores nos últimos anos, que tinham a expectativa de revenda de imóveis a preços mais elevados e realização de um lucro no curto prazo, porém, diante da piora do cenário, eles optaram por desistir da compra. Já as famílias que compraram o imóvel para morar ou para alugar e viver da renda do aluguel no futuro, estão fazendo acordos, negociando e buscando uma solução para manter a compra.

Moura afirma que os distratos tendem a diminuir nos próximos anos, quando houver uma melhora da economia e um nível de concessões de crédito mais razoável.

— Por isso, o mercado deseja que os juros caiam o quanto antes. Porque, com juros menores, haverá maior acesso ao crédito, e o mercado vai conseguir retomar o crescimento. Outro ponto que preocupa o setor é o mercado de trabalho e, principalmente, a confiança do consumidor na economia. Já que a decisão de compra e a realização do sonho da casa própria precisam da confiança de que o comprador manterá o emprego e a capacidade de pagamento da prestação por um período longo, de 20 ou 30 anos.

Fonte: www.r7.com